A solenidade do santíssimo Corpo e Sangue de nosso Senhor Jesus Cristo, Corpus Christi, ou popularmente Corpo de Deus, ajuda-nos a fixar-nos na Eucaristia, naquele pedaço de pão e naquelas gotas de vinho que, no mistério de consagração, a ação do Espírito Santo, se convertem em Corpo e Sangue de Cristo. É o mistério maior da nossa fé. Aldeias, vilas e cidades engalanavam-se para esta majestosa celebração, mais para a Procissão do que para a Celebração.
Cumprindo a tradição, mas sobretudo respondendo ao mandato de Jesus – Fazei isto em memória de Mim – as paróquias da cidade congregaram-se, na Sé de Lamego, à volta de D. António, para celebrar a Eucaristia solene e da Eucaristia acompanharam o Corpo de Cristo, na sagrada Custódia, e transportando pelo Sr. Bispo, por algumas das ruas, saindo da Sé e aí regressando.
Para melhor acolhermos o mistério e recolhermos a abundância dos pedaços que sobram, deixemo-nos guiar pelo nosso pastor, roubando-lhe algumas expressões gravadas e publicadas no blogue “Mesa de Palavras”.
“E, pela página intensa e bela do Evangelho deste Dia grande (Marcos 14,12-16.22-26), começamos por nos dirigir a Jesus para que Ele nos diga «onde» e «como» preparar a sua Ceia. Sim, só Ele sabe verdadeiramente «onde» e «como». E ainda assim, entendamos bem, nós apenas podemos fazer os preparativos. A Festa é com Ele. O Pão e o Vinho, o seu Corpo e Sangue, só os podemos receber d’Ele. E é quanto continuamos a fazer ainda Hoje. Ele é o Bem, Ele é a Bondade, Ele é a Beleza. E a celebração da Ceia Eucarística é sempre dizer Bem, pensar Bem, querer Bem, fazer Bem. É encher de Bem, de Bondade e de Beleza a nossa vida. É assim que estamos em união com Deus e com os irmãos. O Bem une. O mal divide”.
Continuando a refletir e a convidar-nos a entrar no mistério redentor, diz-nos D. António Couto: “Vale-nos, «oh abismo da riqueza, da sabedoria e da ciência de Deus!» (Romanos 11,33), que «Deus permanece fiel, mesmo quando nós lhe somos infiéis» (2 Timóteo 2,13). Aí está, então, o dizer e o fazer novo de Jesus a refazer o nosso dizer e o nosso fazer tão depressa abandonados, aliança rompida: «Eu vim, ó Deus, para fazer a tua vontade», declara Jesus, verdadeiro sumo-sacerdote na Carta aos Hebreus 10,7; cf. Salmo 40,8-9). E «Não se faça a minha vontade, mas a tua», reza Jesus no Getsémani (Marcos 14,36)”.
Tratando-se de fazer… importa mais que seja Ele a fazer e nós a dispormos das nossas mãos e da nossa vida para que Ele permaneça e continue a alimentar as multidões. Solenemente, o nosso Bispo faz-nos ver ou pelo menos contemplar o mistério: “E levando até ao fim o seu amor, ainda nos implica por graça no seu próprio belo fazer. Pegou então numa criança, num pedaço de pão e numa taça. Levantou os olhos e as mãos onde nitidamente pulsava um coração. E ergueu um brinde ao céu. Baixou depois os olhos e as mãos, ungidos já para a dádiva suprema. E ardentemente desejou o vinho novo do reino a chegar. Requisitou, por isso, para isso, o coração, as mãos, a boca, de quantos o estavam a escutar. E antes de partir e de ficar, definitivamente Deus Connosco, abriu ainda à multidão novos caminhos, diurnos, matutinos: «Já sei que não sabeis pedir o pão; tereis de aprender com os meninos».
A finalizar, agora sem interrupções nem acrescentos, sem comentários ou interligações, acolhamos as interpelações de D. António “«Tomai, isto é o meu corpo» (Marcos 14,22); «Este é o meu sangue, o sangue da Aliança, por todos derramado» (Marcos 14,24). «Fazei isto em memória de mim» (Lucas 22,19). Vida partida, repartida, dada por amor. Eis o inteiro programa de Jesus. Eis tudo o que devemos fazer, imitando-o eucaristicamente… É isto que estamos a fazer aqui, nesta Celebração Eucarística, nesta Solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo. Daqui a pouco, o Senhor da nossa vida presidirá e abençoará com a sua Presença, caminhando connosco, no meio de nós, as ruas da nossa cidade. O pálio (pallium) de Deus atravessará a nossa cidade. O pálio de Deus é o manto (pallium) de Deus, os braços carinhosos com que nos abraça e nos envolve, e nos pede para fazermos outro tanto, enchendo de graça e de esperança todos os nossos irmãos. Verdadeiramente, num mundo em profunda crise como este em que vamos, parece que voltamos a viver, como dizia São Paulo aos Efésios, «sem esperança e sem Deus no mundo» (Efésios 2,12).
Entenda-se: sem esperança, porque sem Deus no mundo, connosco, no meio de nós.
11. Jesus Cristo é Deus presente no nosso mundo todos os dias. E o pálio é o manto, o abraço, com que nos acarinha e envolve. De pálio (pallium) derivam, etimologicamente, os cuidados paliativos, que não são apenas os cuidados médicos e de amor que prestamos aos nossos doentes terminais; são sobretudo a expressão de um amor maior, de um manto maior, que nos envolve e nos salva em todas as situações (Gianluigi Peruggia, L’abbraccio del mantello, Saronno, Monti, 2004)”.
In Voz de Lamego, ano 94/29, n.º 4757, de 5 de junho 2024. Citações: Mesa de Palavras – AQUI.