Já o sol transpunha as fronteiras, para lá das Meadas e as sombras escureciam a velha cidade das cortes, as luzes dos modernos apartamentos assinalavam o regresso a casa para o merecido descanso após um dia de trabalho.
Esquecidos, momentaneamente, os deveres paroquiais, a sala habitual de Conferencias do Seminário Maior de Lamego começava a encher-se de “Homens” sequiosos da Palavra da Salvação.
Terminadas as preocupações pastorais da quadra natalícia, era tempo, apropriado, para uma paragem e um encontro mais íntimo, prolongado e pessoal com o presépio, onde pontifica a Palavra feita Pessoa, construído no coração de cada um de nós, sacerdotes desta diocese de Lamego.
Assim aconteceu durante os dias de 13 a 16 de janeiro de 2025.
E da cidade mais alta de Portugal, a cidade dos três fs (fria, farta e formosa), a Guarda, veio até nós, para proclamar essa Palavra, o Dr. Manuel Pereira de Matos, Homem douto e sabedor. É doutorado em Teologia Dogmática pela Universidade Pontifícia de Salamanca, licenciado em Teologia Pastoral pela UCP e em Filosofia Clássica pela Universidade de Lisboa.
Publicou vários livros de que se destaca “Senhora da Alagoa”, “O Fim do Mundo, das Profecias da Desgraça ao Júbilo da Parusia”, “Avé Maria Bendita”, “Glória da Santíssima Trindade”, “Espirito Santo e Espírito de Filiação: Uma Interpretação Trinitária do Pai Nosso”, “Ressuscitarão os Mortos” e “Horizontes da Escatologia Cristã”.
Foi pároco de zonas rurais durante 34 anos; formador e professor no Seminário Maior da Guarda e no Instituto Superior de Viseu durante 22 anos, e é Vigário Geral da Guarda desde 2006.
Começou por apresentar o tema e o método que iria utilizar nestes dias, assim como indicou algumas orientações gerais, como é costume nestas circunstâncias. Mostrou-se de imediato como Homem simples, comunicativo, mas com um pensamento bem estruturado e profundo, de palavra fácil e acessível.
Partindo do princípio de que a “oração” é o “lugar” da nossa comunhão com Deus e também da nossa comunhão com os irmãos, é nesse sentido que devemos entender as nossas orações mais simples e mais habituais.
Propôs, por isso, durante estes dias, uma reflexão sobre o “Glória ao Pai ao Filho e ao Espírito Santo”, sobre o “Pai Nosso”, e sobre a “Avé Maria”, para as rezarmos melhor, com alma e com sentido Trinitário.
O dia 14 começou cedo, com a oração de Laudes e após o pequeno-almoço a primeira conferência sobre “O “Glória ao Pai ao Filho e ao Espírito Santo”, tema cuja exposição se prolongou pela parte de tarde.
Nesta oração que é entre todas a mais breve e mais simples, antecipamos, já na terra, o que será a comunhão no louvor por toda a eternidade. É um louvor à glória de Deus e à comunhão com a Trindade. Não se pode experimentar a totalidade da glória de Deus pois Ele é o Deus da glória. Cada uma das três pessoas é glorificada pelas outras. Assim o vemos no Batismo de Jesus quando o Pai diz: “Este é o Meu Filho muito amado n´Ele pus a minha complacência”. Somos chamados à glória de Deus que é a Sua Santidade e para esta realidade estar sempre presente terminamos cada salmo com o “Glória” e cada mistério do Rosário, igualmente.
O dia 15 foi dedicado ao Pai Nosso. No Pai Nosso, a revelação do mistério de Deus uno e trino, Pai Filho e Espírito Santo, introduz-nos na comunhão trinitária invocando sucessivamente o Pai e o seu nome de Pai, o Filho que é o Reino em Pessoa e o Espírito Santo que é a vontade ou amor em Deus.
Ensinou os discípulos a rezar o Pai Nosso, mas, somente, quando eles sentiram vontade de o fazer porque o viam rezar de forma diferente dos judeus, mais do que por palavras, pelo exemplo e atitude. A marca do seu modo de viver é orante. Oração de Deus significa duas pessoas que conversam. O Pai Nosso é a síntese dos Evangelhos e dos Salmos. Jesus ensina que Deus é Pai e foi a grande revelação de Cristo.
O orador expressou o seu pensamento relativamente ao Pai Nosso como oração verdadeiramente Trinitária, num pequeno cartão, publicado aquando das suas Bodas de Ouro Sacerdotais, que intitulou de “Pai Nosso, Oração Trinitária dos Filhos de Deus” desta forma:
PAI:
Pai-nosso, dos céus e da terra, porque Pai do Unigénito Filho que nas fontes do Espírito nos fez filhos em Si; santificado em nós seja o teu nome de Pai, e, santificados por Ti, por nós sejas honrado na terra inteira. Dá-nos hoje o pão de amanhã, substância da vida presente e futura, dádiva paterna à indigência dos filhos, e fraterna expressão de bens partilhados.
FILHO:
A todos nós venha o teu reino, cuja glória e poder revestiu entre nós a forma servil do Filho humanado; reino dos céus que na terra germina na humilde verdade de justiça e de paz. Perdoa-nos as nossas ofensas, ingratas recusas de amor desviado; perdão que a inimigos o Filho concede, indulgência suprema, exemplo que obriga; como nós perdoamos a quem nos ofende.
ESPÍRITO SANTO:
Seja feita a tua vontade, alto desígnio do Espírito eterno, Vontade – Amor que gera a boa vontade, obediência de filhos, no Espírito Santo. E não nos deixes cair em tentação, prova temível à frágil vontade que o gozo efémero propende a buscar, sedução oriunda do pai da mentira; mas livra-nos do Mal, o Maligno espírito, ao mundo e à carne aliado, invejoso do Bem aos filhos da luz prometido nas arras do Espírito, defensor dos féis.
TRINDADE:
Porque teu é o reino, o poder e a glória, oh! Trindade inefável, sem mudança alguma, a Ti a honra e o louvor, pelos séculos!
Da parte de tarde refletiu-se sobre Avé Maria, Lugar de Comunhão.
É uma oração cristológica. Toda a vida de Maria, desde o Nascimento, a Anunciação, a Visitação, até à Sua Morte, desperta a alegria vincada na expressão Avé por comparação com a que era dirigida ao imperador romano. Contraste com o Avé de Judas no Horto das Oliveiras porque era em sinal de traição. Foi Isabel quem lhe disse que já era Mãe do Senhor e a proclama Bendita. Di-lo porque ficou cheia do Espírito Santo.
Com a Avé Maria entramos na comunhão da alegria com Aquela que é bendita entre as mulheres em consequência de o fruto do seu ventre ser o Bendito. É pelo Espírito Santo que podemos compreender e proclamar que Jesus é Bendito.
O dia 16, foi, na Conferência final, uma oportunidade de abertura ao diálogo no que se refe ao nosso múnus sacerdotal e em relação aos fiéis. Lembrou a preocupação da igreja dos nossos dias em abrir-se ao mundo e citou o documento final da XVl Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos: Para uma Igreja Sinodal: Comunhão, participação, missão.
Foi uma sessão muito útil porque muito prática.
Terminou este tempo de reflexão com a presença do nosso Bispo para presidir à Celebração da Eucaristia. O senhor Bispo deixou uma palavra de incentivo à santidade sempre baseada na Palavra.
“É sempre oportuno, dizia, confrontarmo-nos com a Palavra de Deus que é a Palavra da Salvação, como anunciamos após a proclamação do Evangelho. Nós bem sabemos que não há salvação em nenhum de nós, nem nas coisas deste mundo, pois toda a salvação vem de Deus. É a única Palavra, porque vem de Deus, que pode salvar esta Humanidade doente. “
Fica, aqui, expressa a gratidão, de quantos participaram neste retiro, ao senho Dr. Manuel Matos, pela ajuda que nos deu.
Feitas as despedidas, cada um voltou para casa “por outro caminho”.
E eu que escrevi este texto desejo que este encontro com Jesus que vive em cada irmão nos acompanhe durante todos os dias deste Ano Jubilar de 2025.
Pe. Artur Mergulhão, in Voz de Lamego, ano 95/10, n.º 4787, de 22 de janeiro de 2025