São João da Pesqueira encontra-se no coração da primeira região vinícola demarcada do mundo, onde nasce o famoso Vinho do Porto e vinhos de mesa de prestígio incomparável. As paisagens da região, sucessão infinita de encostas rasgadas em socalcos que os homens desenharam, surpreendem pela grandeza e convidam a uma viagem através da história.
São João da Pesqueira, orgulha-se de deter o Foral mais antigo de que há memória, anterior à criação da nacionalidade portuguesa (1055-1065). Até ao séc. XIX, S. João da Pesqueira era constituída por 4 paróquias (S. Pedro, S. Tiago, Santa Maria e S. João).
O século XVII tinha já percorrido cinquenta e um anos da sua caminhada histórica. Era agora o ano de 1652. A vila da Pesqueira, por sua vez, havia há muito ultrapassado os escassos limites impostos pelas muralhas Fernandinas. Espreguiçava – se agora pelas ruas Direita, Albergaria, Barreira e estendia o braço para os lados da Devesa.
Algures, no seu seio, a Santa Casa da Misericórdia (fundada no dia 26 de maio 1569), por Rui de Távora, havia edificado um pequeno, mas acolhedor e eficiente, hospital. Em lugar de destaque colocaram a imagem de Nossa Senhora dos Remédios.
O mês de maio, desse ano, chegou quente e acolhedor. A natureza, acalentada pelos raios solares, revestiu – se de folhas e flores que, com o seu perfume inebriante, faziam sonhar com um ano próspero e fecundo. Mas no dia 27 levantara – se no horizonte, trazendo consigo altas e acasteladas nuvens brancas, prenunciando tempestade. De facto, pelo meio da tarde, na vila da Pesqueira começou a escurecer. Raios e coriscos, em ziguezagues acrobáticos, iluminavam os céus e o interior das casas com a sua luz forte e intensa. Trovões horríveis sacudiam as frágeis habitações, deixando as pessoas transidas de medo. Granizo e chuva caíam com tal intensidade que penetravam nas casas através do telhado. Enchiam as ruas e ameaçavam transformar – se em autêntico dilúvio.
De todos os lados se faziam ouvir altos gritos de súplica à Nossa Senhora dos Remédios pedindo a Sua proteção. O povo refugia – se na Capela de Nossa Senhora dos Remédios, que é pequena para albergar tantas pessoas. Não se ouvem senão gritos de aflição e desespero. A água chegou, em algumas ruas, às janelas das habitações. As pessoas permaneceram reclinados no regaço da Mãe, sob o seu manto protetor, intercedendo e suplicando a Nossa Senhora dos Remédios que fizesse parar esse enorme cataclismo.
Repentinamente a trovoada cessa, o sol regressa e um arco – íris de bonança aparece no céu. Apenas uma ténue nuvem branca se retém no espaço, como que a dizer a todos que a Mãe estrava presente e os defendeu.
Foi neste ambiente de fé e de dor que o capelão da Santa Casa da Misericórdia de S. João da Pesqueira, prostrado aos pés da Virgem Santíssima implorou a Sua proteção e fez o seguinte voto: “Que no dia 27 de maio de todos os anos, enquanto a Pesqueira existir, se celebrará uma grande festividade, com novena de Missas e terço, em honra de Nossa Senhora dos Remédios”.
Os pesqueirenses, passada a tormenta, reúnem – se à volta dos seus párocos e, verificando que a tormenta não fizera estragos de maior, rompem em louvores à Nossa Senhora dos Remédios, agradecem e prometem relembrar sempre esse dia.
Durante séculos aconteceu em maio. Razões pastorais levaram a que atualmente se cumpra, a Novena a Nossa Senhora dos Remédios, 9 dias antes do último Domingo de agosto. O voto, contudo, sempre se cumpriu (Arquivo da Santa Casa da Misericórdia de S. João da Pesqueira).
O último dia da Novena, decorreu no dia 25 de agosto, com a celebração da Santa Missa, presidida por Sua Excelência Reverendíssima Sr. Bispo de Lamego, D. António Couto.
Em nome da Santa Casa da Misericórdia de S. João da Pesqueira e de toda a comunidade, obrigado pela presença amiga, profunda e simpática, com que nos tem habituado. Pelas 18h00, decorreu a Majestosa Procissão em Honra de Nossa Senhora dos Remédios.
“Nossa Senhora dos Remédios,
Tão grande e bela, esta devoção.
És protetora e Rainha,
És Tu a Padroeira, da Misericórdia da Pesqueira.
Nossa Senhora dos Remédios,
És a força, orgulho dos Irmãos.
A tradição que não passa,
Revertida na beleza desta celebração.
Fica a palavra, a promessa,
De sempre Te honrar: “A novena Rezar”.
Pe. Filipe Pereira, in Voz de Lamego, ano 89/37, n.º 4524, 3 de setembro de 2019