No dia 18 deste mês, faz 100 anos que Karol Wojtyła, o Papa João Paulo II, o Magno, nasceu. Pastoreou a Igreja durante um quarto de século e acendeu uma luz no coração de muitas gentes. E a luz brilhou com mais intensidade quando, já idoso e muito doente se aproximava do fim. Ensinou com a palavra e com a sua vida que um idoso, mesmo doente, tem algo a ensinar.
A prepósito do desaproveitamento da experiência dos idosos, mesmos doentes, escreveu D. António Ferreira Gomes: “Parece-me das coisas mais tristes e lamentáveis, na história da Humanidade e da Igreja, o desperdício da experiência acumulada pelos pais em relação aos filhos ou de cada geração para com a geração seguinte. (…) Ainda mais o é na sucessão ministerial da Igreja, que é por definição Tradição viva”, para concluir que não aproveitar os sacerdotes e bispos idosos é “uma grande perda e como que uma quebra de tradição que tanto interessa à vida da Igreja” (Cartas ao Papa pág. 10 e 11).
O próprio J. Paulo II dissera, em 1980, na catedral de Munique: “A velhice é o coroamento dos estádios da vida. Ela reúne tudo o que se aprendeu e foi vivido, quanto se fez e foi alcançado, o que se sofreu e foi suportado. Como, no final de uma grande sinfonia, retorna os temas dominantes da vida para uma poderosa síntese sonora. E esta ressonância conclusiva confere sabedoria, bondade, paciência, compreensão e esse precioso coroamento da velhice – o amor”.
O seu ministério pastoral foi “redescobrir e ajudar a descobrir a dignidade inviolável da pessoa humana” (CHL, 37), talvez porque a sua vocação sacerdotal surgiu numa “Igreja que defendeu o ser humano, a sua dignidade e os seus direitos fundamentais, uma Igreja que combateu corajosamente pelo direito dos fieis à profissão da sua fe” (J: Paulo II, in Dom e Mistério).
A sua vida de jovem, de padre e de bispo foi marcada por dois sistemas totalitários: -“o nazismo com os horrores da guerra e dos campos de concentração (…) e o comunismo com o seu regime de opressão e de terror (…). A partir daí torna-se fácil compreender a minha sensibilidade em relação à dignidade da pessoa humana e ao respeito pelos seus direitos a começar pelo respeito à vida” (idem).
Na sua primeira encíclica, “Redemptor Hominis”, marcou o seu programa de Pastor, “O Homem é o principal e fundamental caminho da Igreja, caminho traçado pelo próprio Cristo e que imutavelmente o conduz através do mistério da Incarnação e da Redenção” (RH,14). Para ele “os direitos humanos são também direitos de Deus. Por isso a sua tutela e promoção pertencem ao núcleo central da missão da Igreja”.
E exemplificou no final da sua vida:
A imagem - Todos se preocupam com a imagem, gastam milhares em operações plásticas. Ele, sem forças para andar e para ler, diz-nos que a pessoa vale pelo ser e não pelo parecer. Deus olha para o coração e não para o aspeto físico, disse Samuel a Jessé.
- A velhice - A sociedade procura esconder os idosos e, mesmo quem poderia tê-los em casa, mandam-nos para Lares, agora, chamam-se Estruturas, ERPIS. Ele diz-nos que os idosos, apesar das suas limitações naturais têm muito para ensinar.
- O sofrimento - Hoje, ninguém tem paciência para o sofrimento, gastam-me milhões em ben-u-ron’s, ansiolíticos e outros; ninguém compreende o valor do sacrifício. Ele ensinou pela sua vida que os que sofrem, ainda, são úteis à sociedade.
- O fim da vida terrena - O homem, hoje, pensa que é o top, eterno. Ele ensina-nos a lei da vida física – vai-se desgastando, pouco a pouco, até fim.
Enfim, toda a vida procurou por palavas e gestos dar prioridade absoluta à pessoa: “Os direitos da pessoa são os direitos de Deus”.
Pe. Justino Lopes, in Voz de Lamego, ano 90/24, n.º 4559, 12 de maio de 2020