A arte e a devoção estão, quase sempre, em fecunda simetria e harmoniosa conjugação. No caso de Nossa Senhora dos Remédios, a devoção posiciona-se como contínua — e exuberante — «parteira» de arte.
É, pois, uma arte que nasce da devoção que aqui se expõe. Nossa Senhora dos Remédios é um versátil repositório de beleza e de «kerigma» que extravasam a cidade, ecoando em todas as latitudes e modelando sensibilidades sem fim.
O primitivo Monte dos Fragões, transfigurado em Monte de Santo Estêvão para acolher Nossa Senhora dos Remédios, é um assombro que não cessa de deslumbrar. O Santuário, alçado no topo do Escadório e aconchegado pela perfumada vegetação do Parque, avulta como um refrigério de irrepetíveis encantos.
A Festa, que remonta seguramente ao século XVII, é um transbordamento de fé e alegria, que inundam a cidade e atraem multidões das mais diversas proveniências.
Por motivos sobejamente conhecidos, este ano a Festa não poderá realizar-se, o que aliás não é a primeira vez que acontece.
Em 1899, um surto de «peste bubónica» impediu a sua efetivação. Optou-se então por fazer a Novena e a denominada «Festa de Igreja», tendo sido iluminada a fachada do Santuário.
Anteriormente, a febre tifóide (1866), a varíola (1874) e a cólera (1885) foram motivos para recorrer à intercessão da nossa Padroeira, que sempre nos acompanhou a vida inteira.
O que pode ser visto na presente exposição está carregado de uma história preenchida por vivências alojadas no fundo da alma de tantos.
Estas peças, estes quadros, estes cartazes configuram certamente uma simbiose de fé e nostalgia que importa resgatar ao esquecimento.
Em 2020, Lamego estará mais próxima da «quietude e do silêncio», que lhe foram creditados por João de Araújo Correia.
Ainda assim, Nossa Senhora dos Remédios continua a palpitar sonoramente em cada artéria da nossa milenar e cativante urbe. É para Ela que os nossos lacrimosos olhos se voltam.
Como até José Saramago vislumbrou, ao subir o Escadório, o peregrino avista no Santuário «a promessa da salvação ou a esperança». No colo da Mãe, a salvação brilha e a esperança reluz. No colo da Mãe, espera-nos sempre Jesus!
Pe. João António, Reitor do Santuário de Nossa Senhora dos Remédios,
in Voz de Lamego, ano 90/32, n.º 4567, 7 de julho de 2020