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D. António Couto presidiu à Missa Crismal e ao Tríduo Pascal a partir da Sé

A Páscoa é mistério maior da nossa fé, a festa da identidade cristã, o fundamento dos sacramentos e da Igreja.


A Páscoa funda a Igreja, a comunidade dos cristãos. Sem Páscoa, não há sacramentos, não há batismo nem eucaristia, logo, não haveria cristãos.
A importância desta celebração (des)multiplica-se em tradições, tempos de oração, de adoração, de silêncio, mas também de vida e de festa.
O Tríduo Pascal faz-nos entranhar no mistério pascal, recordando, tornando presente, “atualizando” os momentos finais da vida de Jesus, acolhida, vivida, partilhada como dom, como bênção, como serviço de salvação à humanidade.
Antes da Páscoa, o caminho, a entrega, a via-sacra, a crucifixão e morte de Jesus. Só a oferenda total da Sua vida, faz com que Jesus ressuscite, fazendo-nos partícipes do Seu mistério de amor, de entrega e redenção.
D. António Couto presidiu a diferentes celebrações a partir da Sé de Lamego. Na Quinta-feira santa, dois momentos importantes, a Missa Crismal e a Missa da Ceia do Jesus. De manhã, o presbitério diocesano reuniu-se sob a presidência do Sr. Bispo. Durante o decorrer da celebração, os sacerdotes renovaram os seus votos sacerdotais. Foram recordados os padres falecidos durante o último ano, os padres doentes, os padres que fazem este ano as suas Bodas de Prata sacerdotais, Pe. António José dos Santos Ferreira, Pe. José Manuel Rebelo Correia e Pe. Leontino Carvalho Alves.
Seguiu-se, como habitualmente, o almoço no Seminário de Lamego, este ano, não apenas com os sacerdotes, mas também com os convidados presentes na inauguração e bênção da Casa Presbiteral, D. António Francisco dos Santos.
Da parte de tarde, o início do Tríduo Pascal, com celebração da Ceia do Senhor, assinalando a instituição da Eucaristia e do sacerdócio ordenado e, por outro lado, a cerimónia do lava-pés.
A Sexta-feira santa envolve-nos na Adoração da Cruz: ao amor de Deus havemos de responder com adoração, acolhimento, louvor, ação de graças, para depois nos tornarmos portadores desse amor inteiro, pleno, divino.
A Vigília Pascal recentra-nos na Luz do mundo que é Cristo, a noite que dá lugar ao dia, a morte que é vencida pelo amor e pela vida, por Deus; a água que nos faz renascer como criaturas para Deus, a fé que atravessa gerações, sob ação sábia e constante da Palavra de Deus.
Palavra de Deus que é meditada, refletida, mastigada pra se tornar vida. D. António Couto, nosso Bispo, fá-lo em diferentes registos. Vale a pena reter (e reler) alguns dos seus textos poéticos e que pedimos emprestado ao seu blogue “Mesa de Palavras”.

Sobre a “Quinta-feira santa”: “Com esta celebração da Ceia do Senhor, em Quinta-Feira Santa, a Igreja Una e Santa reacende a memória da instituição da Eucaristia, do Sacerdócio e da Caridade, e dá início ao Tríduo Pascal da Paixão e Ressurreição do seu Senhor (o Tríduo Pascal prolonga-se até às Vésperas II do Domingo da Ressurreição), que constitui o ponto mais alto do Ano Litúrgico, de onde tudo parte e aonde tudo chega, coração que bate de amor em cada passo dado, em cada gesto esboçado, em cada casa visitada, em cada mesa posta, em cada pedacinho de pão sonhado e partilhado. É assim que Deus nos dá a graça de caminhar durante todo o Ano Litúrgico, dia após dia, Domingo após Domingo, sempre partindo da Páscoa do Senhor, sempre chegando à Páscoa do Senhor.

“Esta Quinta-Feira é Santa:
Sabe a Deus,
Sabe a pão,
Sabe a alegria,
Sabe a Eucaristia!

Esta Quinta-Feira é Santa:
Sabe a amor,
A dádiva da vida,
A uma lágrima em flor,
Sossegada e comovida.

Esta Quinta-Feira é Santa:
Sabe a Ceia
E a Jesus,
Luz grande que incendeia
As trevas do coração,
E sabe pôr a mesa cheia
de amor e comunhão”.

A Sexta-feira santa interpela-nos, de forma intensa, com a Cruz de Jesus, com a Sua Paixão. “Foi-nos dada a graça de nos reunirmos aqui, na Casa de Deus, nesta Sexta-Feira Santa, para celebrarmos, unidos de alma e coração à Igreja inteira, a Una e Santa, a Paixão do único Senhor da nossa vida, «Aquele que nos ama» (Apocalipse 1,5), Jesus Cristo.
E foi-nos dado seguir, passo a passo, com a conversão do coração e o louvor no coração, o imenso relato da Paixão do único Senhor da nossa vida, a partir do Evangelho segundo S. João (18,1-19,42). Foi assim que atravessámos o Cedron e entrámos no «jardim». É de noite, mas arde a LUZ, a LUZ, a LUZ. É verdade que já não estamos todos. Judas perdeu-se na NOITE, na NOITE, na NOITE (João 13,30). Virá depois com archotes e lanternas – mísero sucedâneo da LUZ – e com armas (João 18,3). Vem prender a LUZ, mas cai encandeado (João 18,6). Tem de ser a LUZ a ofuscar-se por amor e a entregar-se a ele por amor”.

“O Dia de Sexta-Feira Santa
Carrega consigo os derradeiros passos,
Gestos, palavras e olhares de Jesus,
Sobre o árido chão da Palestina,
E sobre o chão duro do nosso coração,
Num pesado concentrado
De dor e de amor.

Mas tudo fica condensado
Nas três horas da tarde desse dia,
Pois é essa a hora que guarda o «grito grande»,
Seguido da morte para a vida de Jesus.

Aquele «grito grande» é o sinal claro
De que Jesus não está sedado,
Anestesiado ou inconsciente,
Mas continua ali,
Naquela Cruz,
Bem presente e consciente,
Vivo,
E que quer viver a sua entrega de dor
E de amor até ao fim.

É o cálice a Ele dado pelo Pai,
Por amor.
Aquele sofrimento extremo é, portanto,
O sofrimento por amor dado,
E por amor recebido,
E não imposto pago e apenas suportado.

Quanto amor é necessário
Para reconhecer na dor e no sofrimento,
Não uma coisa para doer e estoicamente suportar,
Mas um dom extraordinário do amor do Pai,
Uma promessa de luminosa fecundidade e felicidade!

Senhor deste Dia imenso,
Ensina-nos a encher de amor intenso,
A transbordar,
Cada passo,
Cada gesto,
Cada palavra,
Cada olhar!”


E chegamos à Vigília Pascal, aquela noite maior, em que a vida nova de Jesus irradia luz para todos os corações. Ou como sublinha D. António Couto: “Este é o Dia em que desfiamos com amor o rosário das tuas maravilhas, tantas elas são, percorrendo a avenida das tuas Escrituras desde a Criação até à Páscoa, desde a Páscoa até à Criação. Tanto faz. Porque neste Dia novo e belo o tempo não nos mede e nos afasta e nos cataloga em séculos e milénios, mas põe-nos todos a conviver lado a lado. É assim que lemos e compreendemos que no teu «Filho amado», Jesus Cristo, Imagem tua e «primogénito dos mortos», «tudo foi criado» (Colossenses 1,16), «e sem Ele nada foi feito» (João 1,3). Lemos e compreendemos que o «teu Filho, Jesus Cristo, não foi Sim e não, mas unicamente Sim» (2 Coríntios 1,19). Passeámos assim no jardim da tua Criação boa e bela, visitámos as suas 452 palavras (Génesis 1,1-2,4a), e nelas não encontrámos, de facto, um único «não». Tudo céu. Nenhuma parcela de chão envenenado. Se o teu Filho amado, Jesus Cristo, Imagem tua e primogénito dos mortos, foi sempre Sim e nunca não, e se foi n’Ele que foram criadas todas as coisas, então a Criação inteira tem também de ser Sim, Sim, Sim, e nunca não”.

Com a grande noite, com a celebração da Vigília, chegamos aos “País da Páscoa”:

“Acabámos de entrar no país da Páscoa.
Os pátios dos sacerdotes e de Pilatos
Ficaram para trás,
Para trás ficou também o canto do galo,
Os gritos dos guardas e das multidões,
A febre das traições.

O que se ouve agora é o anúncio do Anjo,
A alegria das mulheres,
A Plenitude da Vida a transbordar
Das páginas da Escritura Santa e da Cruz de Jesus,
O rumor do Amor,
De um Amor novo e subversivo,
Que vence óbitos e ódios,
Raivas e violências,
A raiz de um mundo novo a germinar
Daquela noite de Luz
E a entregar Jesus
A quem o queira receber.

Veem-se mulheres e homens a correr,
Belos e leves,
Sobre os montes,
Sem qualquer bagagem a estorvar,
Sem nada a entorpecer,
Como quem acaba agora de nascer.

Move-os apenas a Notícia do Ressuscitado,
A Carícia que acaba de chegar,
E que é preciso levar
À pressa a todo o lado.

Vem, Senhor Jesus Ressuscitado,
Fica Connosco,
Vai connosco,
Que precisamos de ter o coração habitado,
Iluminado,
E incendiado”.

O Domingo de Páscoa, da ressurreição e da vida nova, D. António convida a ler os sinais da Páscoa do Senhor. “O Domingo de Páscoa da Ressurreição do Senhor oferece-nos o grande texto de João 20,1-9, com a descoberta do túmulo aberto, mas não vazio! Túmulo aberto: a pedra muito grande (Marcos 16,4) do poder da morte tinha sido retirada, e o Anjo do Senhor sentou-se sobre ela (Mateus 28,2): impressionante imagem de soberania e vitória! Mas não vazio: está, na verdade, cheio de sinais, que é preciso ler com atenção: um jovem sentado à direita com uma túnica branca (Marcos 16,4), dois homens com vestes fulgurantes (Lucas 24,4), as faixas de linho no chão e o sudário enrolado em outro lugar (João 20,6-7). É importante ler os sinais e ouvir as mensagens! Se o túmulo estivesse vazio, como vulgarmente e inadvertidamente dizemos, estávamos perante uma ausência cega e muda. Na verdade, os sinais e as mensagens mostram uma presença nova que somos convidados a descobrir”.

E a concluir esta jornada imensa e intensa, da Páscoa que continua a efetivar-se na liturgia, nos sacramentos, especialmente na Eucaristia e particularmente em cada Páscoa semanal, o Domingo, onde nos encontramos com o Senhor do tempo e da história, melhor, onde Ele nos encontra, Se encontra connosco e nos faz irmãos Seus.
“ÉS TU, SENHOR!

Tu, Senhor, Tu falas
E um caminho novo se abre a nossos pés,
Uma luz nova em nossos olhos arde,
Átrio de luminosidade,
Pão
De trigo e de liberdade,
Claridade que se ateia ao coração.

Lume novo, lareira acesa na cidade,
És Tu, Senhor, o clarão da tarde,
A notícia, a carícia, a ressurreição.

Passa outra vez, Senhor, dá-nos a mão,
Levanta-nos,
Não nos deixes ociosos nas praças,
Sentados à beira dos caminhos,
Sonolentos,
Desavindos,
A remendar bolsas ou redes.

Sacia-nos.
Envia-nos, Senhor,
E partiremos
O pão,
O perdão,
Até que em cada um de nós nasça um irmão”.

Vale sempre a pena saborear as palavras sábias do nosso Bispo, para que através das palavras, compreendamos melhor a Palavra de Deus e a façamos nossa vida.
“A pedra retirada do sepulcro e o facto de o Anjo se sentar sobre ela indica o fim do domínio da morte. A pedra não é retirada para Jesus sair, mas para que as mulheres possam entrar e verificar a ausência do corpo de Jesus. E a ausência do corpo de Jesus aqui, neste lugar, como bem sabiam as mulheres (Mateus 27,61), mostra que a Ressurreição de Jesus não é menos real do que a sua morte. Não é, todavia, suficiente que as mulheres vejam o túmulo aberto; é necessário o anúncio da Ressurreição feito pelo Anjo. E é ainda o Anjo que as faz dar um novo passo em frente, incumbindo-as de uma missão: «Ide dizer aos seus Discípulos que Ele foi ressuscitado dos mortos e vos precede na Galileia» (Mateus 28,7). E elas partiram imediatamente, e, com alegria grande, correram a levar a notícia (Mateus 28,8). Mas pelo caminho são surpreendidas pelo próprio Jesus Ressuscitado, que as convida à alegria e a não terem medo, e reformula, de forma maravilhosa, o último dizer do Anjo: «Ide dizer aos meus Irmãos…» (Mateus 28,9-10)… Ilumina, Senhor, a tua Igreja Santa, e os seus novos filhos que hoje nascem na fonte batismal. Que os nossos passos sejam sempre firmes, e o nosso coração sempre fiel. Vem, Senhor Jesus! Aleluia!”

E a Páscoa continua, por oito dias e pela vida inteira, em Domingo de Páscoa e em cada um dos outros Domingos. Alguns rostos vêm antes da Páscoa… mas todos nos fazem (re)descobrir Jesus. Já dentro da Oitava de Páscoa, D. António Couto insere-nos no “Percurso de Maria Madalena”, a partir do evangelho joanino: “A narrativa de João 20 abre com a Madalena, que vai de manhã cedo, ainda escuro, ao túmulo de Jesus, e vê, com um olhar normal (verbo grego blépô) a pedra retirada (êrménos) para sempre e por Deus (João 20,1), tal é o significado imposto por êrménos, particípio perfeito passivo de aírô. Conforme a grandiosa narrativa, a Madalena tem diante dos olhos o inefável. Mas cega como está pelos seus preconceitos, falha a visão do inefável, e corre logo para trás, equivocada e baralhada, a levar a Simão Pedro e ao outro discípulo uma falsa notícia: «Retiraram (êran: aoristo de aírô) o Senhor do túmulo, e não sabemos onde o puseram» (João 20,2). Aquele «retiraram», no tempo histórico (aoristo grego), sugere que foram mãos humanas a roubar o cadáver de Jesus, lenda já astuciosamente fabricada e divulgada pelos judeus em Mt 27,64; 28,13-15. Mas o equívoco da Madalena não é de admirar, dado que ela anda pelo escuro, e, no IV Evangelho, quem anda no escuro ou na noite, não consegue ver a Luz”.
Nas palavras do Papa Francisco, é quando nos colocamos a caminhar e a anunciar que Ele Se deixa ver. Cabe-nos, então, como Maria Madalena, partir e anunciar aos irmãos a vida nova que Jesus nos traz.

 

in Voz de Lamego, ano 93/21, n.º 4701, 12 de abril de 2023

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