A quinta-feira santa inicia, tradicionalmente, com a Missa Crismal. Este ano mais libertos de máscaras e outros condicionalismos devidos à pandemia, reunimo-nos, Bispo, sacerdotes e povo santo de Deus, na Sé de Lamego. Depois da santa Missa, com a bênção dos óleos dos catecúmenos e dos enfermos e com a consagração do óleo do Crisma, sacerdotes, Bispo e alguns convidados, deslocaram-se para o Seminário para a inauguração e bênção da Casa Presbiteral D. António Francisco dos Santos.
D. António Francisco dos Santos, originário de Tendais, concelho de Cinfães, diocese de Lamego, frequentou os Seminários Diocesanos. Após ter obtido um complemento de formação nas áreas de Filosofia e Sociologia, regressou ao Seminário de Lamego para integrar a equipa de Formadores. Foi Vice-Reitor de muitos dos nossos sacerdotes.
Ainda, como aluno, foi bafejado com os novos horizontes rasgados pelo Vaticano II, de que se tornou abertamente paladino na reforma litúrgica e no espírito pastoral. Como padre, interiorizou o rosto novo do ser presbítero nesta Igreja Particular. O testemunho evangélico do “seguir Cristo”, alicerçado no “deixar tudo” para O seguir, tornou-se rosto da sua vida apostólica. Desde a primeira hora, pensou que a purificação do presbitério passava por um novo estatuto económico do clero e a consequente despreocupação quanto ao seu futuro, mormente, quando o cansaço, a doença ou a velhice o impeçam do exercício normal do seu ministério. Postos de lado os falsos valores com que se pretendiam valorizar com a vida do pastor: promoção social e familiar, sucesso económico e acumulação de bens terrenos, carreira eclesiástica, o pastor é chamado ao despojamento na humildade do estar ao lado do seu rebanho nas suas lutas, alegrias e contrariedades. A identificação a Cristo, que quis estar sempre junto dos homens como quem serve, tornou-se como que a recomendação final aos seus discípulos, mesmo antes de lhes confiar a Sua missão.
Como responsável por estruturas diocesanas de apoio ao exercício presbiteral começou, ainda em Lamego, a criar pensamento, na dignificação da vida do presbítero, da sua digna sustentação e estruturas de apoio.
Nomeado bispo de Aveiro, primeiro, e, depois do Porto, procurou, nessas porções do povo de Deus, colocar em prática o que tinha pensado na e para a Diocese de Lamego, sobretudo enquanto Vice-Reitor do Seminário e depois Pró Vigário Geral da diocese.
A Casa Presbiteral tornou-se uma exigência para um novo olhar sobre o viver do clero: proteção e acolhimento, para que, os sacerdotes libertos das preocupações presentes e futuras, possam entregar-se de alma e coração à missão evangelizadora e pastoral.
No dia 9 de fevereiro de 2021, em Roma, foi apresentado um documento da Pontifícia Academia para a Vida sobre a condição da terceira idade depois da Pandemia. Entre os vários pontos abordados, existe um que se intitula: “O Encontro entre Gerações”. Esse ponto refere que o homem que envelhece não se aproxima do fim, mas do mistério da eternidade. Para entender isto, ele precisa de se aproximar de Deus e viver na relação com Ele. Cuidar da espiritualidade dos idosos, da sua necessidade de intimidade com Cristo e de partilha da Fé é uma tarefa de caridade na Igreja. É somente graças aos idosos que os jovens podem redescobrir as suas raízes. É somente graças aos jovens que os idosos recuperam a capacidade de sonhar.
Foi a pensar nestes novos desafios, que em janeiro de 2022 se iniciou a requalificação de uma ala do Seminário de Lamego que, ao longo de mais seis décadas, foi e é a casa de onde muitos jovens sacerdotes partiram e partem para exercer o seu ministério sacerdotal. No declinar da sua missão queremos que esta casa seja o lugar do regresso de quem se entregou e se gastou ao serviço da Igreja, para aqui encontre o acolhimento merecido.
As obras nascem quando os homens querem e completam-se quando a capacidade dos homens atua. Com autorização do Sr. D. António Couto, Bispo de Lamego, e a determinação de Mons. José Guedes e do Reitor do Seminário P. Filipe Pereira, (entre outros), tudo começou a ganhar forma.
Verdadeira maratona se olharmos à dimensão, aos tempos e às crises. Aí está a Casa Presbiteral D. António Francisco dos Santos.
Este nome, destacadamente gravado na parede de entrada, é um ícone do Seminário, da Diocese e da ASEL. Este nome evoca, invoca e perpetua, no espaço e no tempo, na história e na memória, o homem, o Padre e o Bispo que nos habituamos a recordar nas nossas vidas e recorrer nas nossas preces.
Num percurso quase paulino, de Cinfães a Resende, Lamego, Paris, Lamego e depois Braga, Aveiro e Porto, D. António Francisco deixou um rasto inesquecível de personalidade, trabalho, conhecimento, sabedoria, disponibilidade, bondade e quase santidade. Todos nos orgulhamos, e a ASEL sobremodo, de podermos dizer: «o nosso D. António Francisco».
Como dizia historiadora Emília Viotti da Costa, “Um povo sem memória é um povo sem história”.
Uma palavra de gratidão à memória do Sr. Bispo D. João da Silva Campos Neves que pensou, projetou e inaugurou o Seminário, em 1961, passando por todos os Reitores, Formadores, Funcionários e Benfeitores até ao presente.
Uma palavra de gratidão a todos os que estiveram presentes, no dia 6 de abril, concretamente ao nosso Bispo, D. António Couto, pela presença, inauguração e bênção da Casa Presbiteral. Ao Sr. Bispo Emérito, D. Jacinto Botelho, Srs. Vigário Geral e Pró Vigário Geral, Sacerdotes e Diáconos; aos Srs. Presidentes das Câmaras Municipais de Lamego (Eng. Francisco Lopes) e de Cinfães (Enf. Armando Mourisco) e seus executivos. Aos Srs. Presidentes das Juntas de Freguesia de Lamego (Dr. Nuno) e Tendais (Nuno Leal), ASEL e Amigos e Benfeitores convidados.
Gratidão a todos os que ajudaram e ajudam a percorrer este longo, penoso, mas profícuo caminho.
P. Adriano Monteiro / Dr. Adão Sequeira, in Voz de Lamego, ano 93/21, n.º 4701, 12 de abril de 2023