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Entrevista ao Bispo eleito, D. Joaquim Proença Dionísio

O Padre Joaquim Proença Dionísio, eleito Bispo Auxiliar do Porto, será ordenado, na Sé de Lamego, no próximo Domingo, a 16 de julho. Antes da ordenação quisemos trocar algumas impressões com ele.
Natural de São Martinho de Cimbres, concelho de Armamar, onde nasceu a 11 de setembro de 1968. Frequentou o Seminário Maior de Lamego e foi ordenado sacerdote na Catedral de Lamego em 31 de julho de 1993. Após a ordenação, foi Vigário Paroquial em Tarouca, são João de Tarouca e Gouviães, de 1993 a 1995. Foi capelão das comunidades de língua portuguesa em Frankfurt, na Diocese de Limburgo, e acompanhou as comunidades de língua portuguesa presentes na Diocese de Evry-Corbeil-Essones, em França. Regressando a Portugal, foi pároco da paróquia do Santíssimo Salvador da Penajóia, entre 2002 e 2013. Foi reitor e professor no Seminário Maior de Lamego e professor no Instituto Superior de Teologia em Viseu, diretor do semanário diocesano “Voz de Lamego”, diretor da Comissão Diocesana para as Vocações e Ministérios, diretor pedagógico e diretor da Escola Profissional de Lamego e diretor do Centro de Estudos Fé e Cultura (CEFECULT) para a formação de agentes da pastoral.
O novo bispo estudou Teologia Sistemática na Faculdade de Teologia e Ciências Religiosas do Institut Catholique de Paris, onde obteve, em 1 de julho de 2002, o grau de mestre em Teologia. De 2013 a 2020, foi reitor do Seminário Maior de Lamego e de 2020 até ao presente é reitor do Santuário de Nossa Senhora da Lapa e pároco de São João Baptista, em Quintela da Lapa, no município de Sernancelhe. Em 2021, foi também nomeado pároco de Nossa Senhora das Neves, em Granjal, e de Nossa Senhora da Conceição, em Lamosa, ainda em Sernancelhe. Era também, até ao momento, cónego do Cabido da Sé de Lamego.
Traçado um breve perfil, vamos a algumas questões.

Voz de Lamego: O Senhor D. Joaquim escolheu o lema “E Jesus caminhava com eles” (Lc 24, 15), certamente, fazendo adivinhar já que o seu múnus episcopal assentará, essencialmente, num processo sinodal, privilegiando e escutando todas as expressões do povo de Deus, em ordem a uma maior comunhão, participação e missão de todos.  Que forma, estilo e estruturas deve assumir a Igreja portuguesa, hoje, na atualização da sua corresponsabilidade e participação na missão da nova evangelização, num país cada vez mais descristianizado?

D. Joaquim Dionísio: A sinodalidade, dimensão constitutiva da Igreja, está na ordem do dia e todos desejam que vá além de assembleias ou conselhos esporádicos e conduza a uma verdadeira corresponsabilidade. Porque põe à mostra a igual dignidade de todos os batizados e porque recorda a comum missão a cumprir. Aliás, as três palavras que acompanham o anúncio do Sínodo (Comunhão, Participação, Missão) sublinham o carácter comunitário da iniciativa e recordam o quanto os batizados, sensíveis à universalidade da Igreja, estão abrangidos e implicados neste processo. E há questões que se levantam: como respeitar a igual dignidade de cada um num contexto hierárquico? Como favorecer a escuta de todos, também dos que nunca se exprimem? Como colocar-se, juntos, à escuta do Espírito Santo? Como viver a autoridade como serviço?
A conversão sinodal da Igreja, isto é, de todos os seus membros, é um processo que não se esgota em alguns eventos ou iniciativas, mas que visa dar à Igreja um novo estilo: mais aberta e acolhedora, favorecendo a participação, a escuta recíproca, o diálogo, o acolhimento, a fraternidade… É claro que isto é muito mais fácil de dizer do que pôr em prática! Mas estamos no caminho e não vamos sós ou às escuras. E porque falamos de processo e não de evento, compreendemos a importância da fidelidade, da continuidade, da formação…

Voz de Lamego: Na Igreja sinodal, a missão do anúncio e testemunho do Evangelho é assumida por todo o Povo de Deus, e não apenas por uns poucos. Não acha que, depois das várias fases de consulta ao Povo Deus, preparando o Sínodo de 2023, continua a ser visível, ainda, uma demorada “estiagem” neste processo de renovação, logo a partir do conceito ainda tão arreigado, quer nos Bispos, sacerdotes e fiéis leigos, da conceção de “uma Igreja cada vez mais vertical”?

D. Joaquim Dionísio: É verdade que o esforço protagonizado nas assembleias sinodais parece ter esfriado após a apresentação das propostas e das sínteses. Mas o processo continua, talvez com menos visibilidade, e não desapareceu do seio de muitas comunidades e das diferentes estruturas da Igreja local. Há também a expectativa das assembleias sinodais de 2023 e 2024, das propostas que daí sairão e, sobretudo, da habitual Exortação pós-sinodal.
A renovação da Igreja tem que ser permanente, até para ser fiel à missão recebida. E todos somos testemunhas da necessidade de tempo e de condições favoráveis para as mudanças julgadas necessárias. Não há dúvidas que o caminho é esse, que nem sempre o ritmo é o desejado, mas também devemos ser justos e reconhecer o quanto já se andou para favorecer e concretizar a participação e afastar a tentação do clericalismo.

Voz de Lamego: O Senhor Bispo, foi durante alguns anos, Reitor do Seminário de Lamego, com os Seminaristas de Teologia a frequentar o Seminário Inter-diocesano em Braga. Esta experiência terá sido uma opção que trouxe ao processo formativo, dos nossos seminaristas, uma maior valorização, principalmente no campo pastoral, para melhor servirem a diocese a que pertencem?

D. Joaquim Dionísio: O Seminário Maior Interdiocesano de S. José, criado pelas dioceses de Lamego, Bragança-Miranda, Guarda e Viseu e instalado em Braga, visou responder a questões então colocadas e representou uma nova etapa na formação dos seminaristas, dando continuidade a um caminho conjunto. É natural que, passados dez anos, uma avaliação seja feita e se procure discernir sobre o rumo a seguir, atendendo à experiência existente, aos desafios identificados e às perspetivas que se vislumbram. E certamente que essa avaliação está a ser feita.

Voz de Lamego: Sentimos já, na nossa Diocese de Lamego, uma diminuição cada vez mais acentuada das vocações sacerdotais e religiosas devido às dificuldades que enfrentam os jovens, resultantes, em grande parte, à sua vulnerabilidade e ao debilitamento da sua identidade espiritual, ao impacto de alguns dos atuais modelos culturais e à frágil situação das famílias. Partindo da sua experiência como Reitor do Seminário, como formar os futuros sacerdotes, para que possam responder aos desafios colocados à atual responsabilidade pastoral?

D. Joaquim Dionísio: A escassez vocacional é uma evidência, apesar do esforço em chamar e acompanhar no discernimento. Acreditamos que o Senhor guia a Igreja e que o caminho da sinodalidade proporcionará respostas inspiradas, como noutros momentos da história. Sobre uma formação que torne os sacerdotes mais capazes para os desafios que se lhes deparam, talvez seja importante recordar-lhes que a formação inicial, integral e integradora, deve ser continuada e aprofundada de forma permanente. Por outro lado, também poderá ser oportuno ir recordando que a pertença ao presbitério não pode ser descurada.

Voz de Lamego: Quando foi conhecida a sua eleição para Bispo Auxiliar do Porto, o Senhor Bispo servia, como Reitor, um dos Santuários Marianos mais importante da Diocese. Como vê a religiosidade popular, que reúne, tantas vezes, crenças, práticas, rituais, narrativas, símbolos originários de outras fontes, como um caminho para a celebração da Fé?

D. Joaquim Dionísio: O Santuário de Nossa Senhora da Lapa, que este ano comemora 525 anos de vida, é uma referência na nossa diocese e, como tantas realidades eclesiais, também é marcado pela piedade popular, compreendida como expressão das gentes simples que assim ultrapassam as fórmulas clássicas da liturgia oficial e as mediações clericais, privilegiando um sentimento ancorado na intimidade da relação pessoal com Deus. Os elementos sensíveis, corpóreos e visíveis que a caracterizam, são expressão da adesão a Cristo e do amor à Virgem Maria e uma maneira de invocar os santos. Uma pastoral elitista corre o risco de perder de vista o povo nas suas expressões de fé, embora nem sempre livres de alguns desvios que importa ir denunciando.
Como no-lo recorda o Papa Francisco (AE), na piedade popular podemos ver como a fé é recebida, incarnada numa cultura e como continua a transmitir-se. E fala desta realidade eclesial como “lugar teológico”. Importa reconhecer o seu valor, salvaguardar o verdadeiro, purificar o que for necessário à luz da Escritura e orientá-la para a liturgia. Neste santuário, como em tantos lugares, há sempre algo de profundo e humano no que observamos.

 

in Voz de Lamego, ano 93/34, n.º 4714, 12 de julho 2023

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