“Eis-me aqui, envia-me” (Is 6, 8)
Todos somos chamados a uma vocação. A própria palavra “vocação” vem do verbo latino “vocare” que significa precisamente chamar. O Senhor chama. O Senhor envia. No entanto, não podemos cair no erro de entender que este vocábulo só diz respeito aos sacerdotes ou aos religiosos. O termo vocação é bem mais amplo.
Fui educado numa família profundamente cristã, onde a oração do terço fazia parte do dia-a-dia da nossa casa e mesmo durante a semana, quando regressava das aulas, ia à Eucaristia. Era muito novo, ainda não percebia o que se passava, o que se vivia e celebrava na Eucaristia, mas havia algo no “senhor abade” que me impressionava, talvez a forma como celebrava, talvez a sua serenidade e bondade.
Para falar do meu percurso vocacional teremos que recuar ao ano de 2003/2004. Estava no 6ºano, na Escola Básica Gomes Teixeira de Armamar. Foi num domingo, após a celebração dominical, que o meu pároco, na altura Pe. José Filipe Ribeiro me convidou para ir passar um fim-de-semana ao seminário. Tinha 11 anos e nunca ninguém me tinha falado do seminário, por isso deixei-o, literalmente, sem resposta. No entanto, a palavra seminário não me saía do pensamento, e não perdi muito tempo até conseguir saber o seu significado. Questionei a minha mãe acerca do seminário e ela explicou-me que era uma casa onde viviam rapazes da minha idade e até mais velhos e que faziam tudo o que eu fazia em casa. Perante esta resposta, a dúvida ainda crescera mais. Afinal, se aqueles jovens faziam tudo o que eu fazia, qual a necessidade de estarem a viver numa casa, longe das suas famílias?
Decidi aceitar a proposta do meu pároco e fui até ao seminário de Resende. Assim tinha a certeza que iria acabar por descobrir, por mim próprio, o que era o seminário e o que faziam aqueles que lá viviam. O certo é que esse fim-de-semana foi especial e só aí é que percebi que o seminário era como que uma família. Era um lugar onde viviam aqueles que colocavam a hipótese, nas suas vidas, de um dia virem a ser sacerdotes. Participei em mais 2 encontros de pré-seminário e nesse mesmo ano matriculei-me no 7ºano.
A minha vida acabara de dar uma volta de 180 graus. Deixara a família, os amigos da terra e da escola para, juntamente com os colegas de seminário, iniciarmos um novo ano-letivo. Tudo era novo: o seminário, os colegas, a escola. A adaptação não foi fácil, sobretudo pelo facto de estar mais afastado da minha família. Contudo, com a ajuda dos formadores, dos colegas e sempre com a proteção de Nossa Senhora de Lourdes, as dificuldades foram diminuindo. Fui-me apercebendo, com o passar dos anos, que a expressão do Evangelho “Vem e segue-Me” (Mt 19, 21) gravada na capela do seminário de Resende era um chamamento que me era feito dia após dia e que eu era convidado a dar uma resposta a este chamamento: “eis-me aqui, envia-me”.
Chegado ao 12ºano foi preciso tomar novamente uma outra decisão. Como qualquer jovem que chega a esta fase, também eu senti necessidade de pensar acerca do meu futuro. Tinha duas hipóteses: continuar a estudar, num curso superior, ou ir trabalhar. Foi nesta fase que me propuseram 2 encontros de pré-seminário, no Seminário Maior de Lamego, e foi precisamente nestes encontros que senti algo a chamar-me de novo. Senti que era Ele que me dizia novamente: “Vem e segue-Me”. Depois de conversar com as equipas formadoras e com alguns colegas do seminário maior decidi, mais uma vez, arriscar e segui-Lo.
Os anos que passei no seminário maior foram muito marcados pelo contacto com colegas de outras dioceses: nos dois primeiros anos com as idas a Viseu, onde frequentávamos as aulas no Seminário Maior da diocese; nos três anos seguintes com a residência no Seminário Interdiocesano de São José e a formação na Faculdade de Teologia, em Braga. No último ano (6ºano) estive no Seminário Maior de Lamego, onde pude ter uma formação mais prática e pastoral, complementando assim o curso teológico.
Neste momento estou a realizar o meu estágio pastoral, nas paróquias da Beselga e Sernancelhe, confiadas aos padres Carlos Carvalho e Francisco Marques e a preparar-me para dizer novamente “eis-me aqui” na Ordenação Diaconal.
Acabamos de viver mais uma semana de oração pelos seminários e, desta forma, quero deixar o meu profundo agradecimento a estas casas que me acolheram durante 13 anos, bem como às equipas formadoras e colegas que conheci e com quem partilhei o meu dia-a-dia. Peço também ao Senhor da Messe que fortaleça os nossos jovens, para que um dia também sintam o seu chamamento e que tenham coragem de responder “sim”.
Vítor Teixeira Carreira, in Voz de Lamego, ano 87/51, n.º 4437, 21 de novembro de 2017