Quem entra na Sé de Lamego depara-se, agora, com o espaço do presbitério requalificado. No mesmo lugar, sob o transepto, mas diferente. Em vez da alcatifa vemos um soalho em madeira. As escadas da frente estão mais curtas para permitir um espaço próprio para a Liturgia da Palavra e um simétrico para uma estante.
Contudo, o que surpreende mais pela novidade e pela imponência é o altar. A conhecida mesa de madeira deu lugar a um novo altar e de pedra de xisto. Seguindo pela nave central, de olhar fixo no altar, vemos evidenciar-se a forma de uma videira representada, em relevo, na pedra. Lá estão a cepa, as folhas, as uvas, penetradas pela luz que irradia do interior.
Primeira questão: porquê um novo altar?
A carpete que cobria todo o presbitério já estava muito usada. Tinha de ser substituída. Pensámos, então, que era mais digno um soalho em madeira de castanho. Por outro lado, era necessário distinguir o espaço da Liturgia da Palavra. Daí se encurtarem as escadas de acesso ao presbitério, para dar lugar a um avançado onde está o ambão. Finalmente, o altar que tínhamos foi, sempre, considerado provisório. Não fazia justiça à grandeza da nossa Catedral. Achámos que era a hora de termos um altar digno e nobre na Sé da Lamego.
Segunda questão: porquê este altar? O que motivou esta conceção de altar? Porquê a videira? Porquê o xisto?
É óbvia a relação da videira com a Eucaristia celebrada no altar. Nele oferecemos o pão e o vinho, este “fruto da videira e do trabalho do homem” (ritual da Eucaristia), para se transformarem, respetivamente, no Corpo e Sangue de Cristo.
Mais ainda. Cristo afirmou “Eu sou a videira e vós os ramos” (Jo 15, 5a). Ora, segundo a tradição da Igreja, Cristo é o verdadeiro altar. Ele é o sacerdote, a vítima que se oferece em sacrifício e o altar. Deste modo, a videira representa o próprio Cristo e nós a Ele unidos.
Estas são razões de ordem teológica e litúrgica que tivemos em conta. Mas houve outras e de outro teor.
Logo que nos propusemos avançar com este projeto a questão que se pôs de imediato foi esta: estando a Catedral de Lamego implantada na região do Douro, única no mundo, e sendo o cultivo da vinha transversal a toda a diocese, como traduzir esta especificidade na conceção do seu altar? Como torná-lo, também, único, genuíno? A partir daí, a escolha de fazer representar uma videira no altar foi quase intuitiva. E na opção pelo xisto não houve muita hesitação, pois é a pedra característica do Douro. Mais difícil foi materializar a ideia. Nisso a arquiteta encarregue do projeto teve um momento de rara inspiração. Após aprovação feita por uma comissão presidida pelo nosso Bispo veio a fase de execução, a qual se revelou bastante complexa e morosa.
Colocado o altar quisemos fazer sobressair no soalho um corredor de cor térrea que vai da nave até à presidência, passando pelo altar. Deste modo, vemos uma videira implantada na terra, serpenteando no meio do xisto, banhada pelo sol, de cujos frutos se produz o vinho delicioso, obra de Deus e do homem, e que se oferece no altar para salvação do mundo.
O altar será sagrado pelo nosso Bispo no Pontifical da Solenidade do Corpo e Sangue de Cristo, a celebrar às 16h do dia 31 de maio. O dia em manifestamos solenemente a nossa fé e o nosso amor a Cristo presente na Eucaristia é bem apropriado para sagrar o altar em que esta presença se torna real.
P. José Ferreira