Como seria espectável, e num ano dito “normal”, de 9 a 17 de agosto iria decorrer em Penela da Beira a novena e festa em honra de Nossa Senhora da Piedade, Senhor dos Passos e Senhor da Aflição, com foguetes, muita música, bandas, conjuntos, muitos comes e bebes, resumindo: muitos excessos. Podemos mesmo dizer que os “Grandiosos Festejos” em Penela da Beira tinham tudo, menos o sentido pelo qual existem á dezenas de anos: o honrar e dar graças aos oragos a eles dedicados.
Ao longo dos últimos anos a componente profana destas festividades foi-se sobrepondo à parte devocional e religiosa, o que fazia com que fossemos esquecendo da razão principal da construção da capela de Nossa Senhora da Piedade na sua génese, enquanto legado espiritual dos nossos antepassados, que quiseram perpetuar dessa forma a sua devoção a Maria e seu filho Jesus Cristo, no quadro doloroso da sua paixão e morte.
Mas se há alguma coisa que esta pandemia nos veio demonstrar, é que não devemos dar nada por adquirido, que se agora nos sentimos os maiores e que nada nem ninguém nos detém, imediatamente a seguir tudo pode ser alterado e, vem um vírus microscópico que nos obriga a ficar fechados em casa, a usar máscara, a alterar toda a nossa vida e rotina.
Mas a Mãe do Céu está lá e, como Mãe que olha pelos seus filhos cá na terra, permitiu que junto do seu amado Filho que se realizasse a verdadeira festa em sua honra, e que a mesma fosse vivida na sua génese devocional, pois possivelmente neste ano de 2020, foi vivida com o mesmo sentido aquando da sua criação no ano de 1892 e nas décadas seguintes.
Do dia 9 ao 15 de agosto, sempre pelas 21 horas, decorreu a novena, que constou da meditação do terço, com reflexões do Santo Padre entre cada mistério, sobre o tempo da pandemia que vivemos, seguido da celebração da eucaristia com pregação. Com todos os cuidados e cumprindo as regras emanadas pela DGS e recomendações da CEP, a novena ao contrário dos outros anos que era celebrada no interior da capela, este ano foi realizada no recinto das festas, onde foram colocadas cadeiras e preparado o altar da celebração, sempre com as devidas precauções por parte dos participantes.
Dado que o espaço é grande e amplo as pessoas usando máscaras puderam manter esse distanciamento social que nos é pedido, mas que não impediu esta união em volta do altar e da Mãe do Céu e nem mesmo as noites frescas que se fizeram sentir desmobilizou as pessoas que ali foram manifestar a sua fé, pedir, agradecer…
No dia 16, o dia de festa por excelência, pelas 18 horas teve início a celebração da eucaristia dominical e de festa.
É ao som de uma gravação de marchas de procissão interpretadas por uma banda filarmónica, que a imagem de Nossa Senhora da Piedade belissimamente adornada no seu andor, e para comoção das pessoas, surge na porta da capela e dá a volta ao recinto para ficar junto ao altar da celebração.
Foi em silêncio e recolhimento que decorreu a santa missa, na simplicidade dos cânticos preparados pelo grupo coral e nas palavras dirigidas ao povo pelo seu pároco, o padre Luciano Moreira.
Terminada a missa, e respeitando os avisos e pedidos do pároco para que as pessoas não se aglomerassem atrás do andor, foi com respeito e comoção que mantendo-se cada um no seu lugar, as pessoas assistiram ao recolher do andor de Nossa Senhora à capela, novamente ao som da banda filarmónica.
Já no cimo das escadas em frente à sua capela, Nossa Senhora da Piedade virada para o povo em jeito de bênção final lança o seu olhar maternal sobre todos os presentes e ausentes e sobre a paróquia de Penela da Beira.
Foi ao som do cântico: “Nossa Senhora da Piedade, que está no seu altar…” e debaixo de uma salva de palmas sentidas num misto de comoção e alegria, que a imagem no seu andor recolheu à capela. Naquele momento sentiu-se como que uma verdadeira “explosão” de regozijo e gratidão pela forma tão digna e sentida como decorreram as cerimónias que a todos tocaram no coração.
Assim decorreram as festas de Penela da Beira neste ano de pandemia, sentimos a falta da procissão, dos foguetes, do arraial, dos bailaricos e arruadas, das músicas, do bulício próprio destes dias, também importantes, mas ao mesmo tempo, vivemos a festa no estado mais puro e devocional. Se para alguns esta não foi festa, uma certeza nos ficou, fez-se festa no céu, pois Nossa Senhora da Piedade não deixará de olhar com olhos de mãe para todos os que contribuíram para que esta decorresse desta forma tão sublime, desde os que diariamente preparavam o espaço da celebração, a quem decorou tão belissimamente o andor, a capela, quem pôs o som, quem colaborou em algum momento e a quem ali esteve… fosse para pedir, ou agradecer, esta foi a forma simples e genuína que Penela da Beira e as suas gentes encontraram para honrar a sua Mãe do Céu.
Que Nossa Senhora da Piedade junto de seu Filho interceda por todos nós e nos livre desta pandemia que assola o mundo inteiro…
Nossa Senhora da Piedade, rogai por nós!
Senhor dos Passos e Senhor da Aflição, tende compaixão de nós!
J. S. N., in Voz de Lamego, ano 90/37, n.º 4572, 25 de agosto de 2020