Na Semana do Consagrado, os cristãos são convidados a rezar, de forma especial, por todos os consagrados, para que sejam fiéis e felizes. Damos graças a Deus pelos homens e mulheres que, nas variadas formas de consagração, permaneceram fiéis ao espírito e ao compromisso que assumiram. Esta fidelidade é razão forte para se sentirem felizes e para merecerem o reconhecimento de toda a Igreja e da própria sociedade.
Nestes tempos em que predomina a cultura do provisório que instiga ao experimentalismo, a fidelidade aos compromissos, sobretudo aos que implicam a entrega da totalidade da vida na lógica do evangelho, é desvalorizada. Talvez isso ajude a perceber melhor a razão pela qual à nossa volta há tanta gente insatisfeita e insegura, pessoas com medo de tomar decisões e outras ainda com as marcas da frustração ou as feridas do fracasso. Em tal contexto a fidelidade na vida consagrada é ainda mais posta à prova e enfrenta desafios mais exigentes. Mas a quem ousa fazer escolhas ponderadas e permanece fiel é prometida uma felicidade duradoura e profunda. Quem, pelo contrário, cede à ânsia de beber em todas as fontes sem descobrir que Jesus Cristo é a verdadeira fonte da água viva, dificilmente poderá saborear essa felicidade.
A fidelidade foi sempre apresentada como caraterística essencial do amor, do divino e do humano. Todo aquele que ama verdadeiramente procura ser fiel. O cristão reconhece que, ao longo da história, Deus foi fiel à sua palavra e vê em Jesus Cristo, o Filho sempre fiel ao Pai e à missão até ao fim. Aquele cujo alimento era fazer a vontade do Pai (Jo.4,34) convidou os seus seguidores a permanecerem no seu amor (Jo.15,9). A esses que permanecem unidos a Ele no amor, como o ramo à videira, o Senhor prometeu que dariam muito fruto, seriam atendidos nas suas preces e receberiam uma alegria completa.
Na vida dos consagrados, a fidelidade é uma exigência dirigida a homens e mulheres enraizados no amor de Cristo, verdadeiramente livres e conscientes de que a graça de Deus pode realizar esta e outras maravilhas nas suas vidas. Uma fidelidade que não se confunde com imobilismo ou cristalização, que não se resigna ao conformismo ou ao desânimo, mas se traduz em atitude de autêntica escuta de Deus e docilidade ao Espírito Santo que renova e recria todas as coisas. O que é que Deus nos quer dizer hoje? O que é que o Espírito inspira aos consagrados e consagradas em ordem à missão da Igreja e ao serviço do mundo, nomeadamente dos mais pobres, dos mais frágeis e descartados? Ser fiel a Jesus Cristo e ao seu evangelho numa forma de vida consagrada implica a coragem de se deixar interpelar por estas e outras questões que se colocam hoje a toda a Igreja.
Um importante apelo foi dirigido a todos pelo Papa Francisco na recente Encíclica Fratelli Tutti: o de renovar o sonho de uma humanidade mais fraterna. Inspirado no exemplo de São Francisco de Assis e na sua «forma de vida com sabor a evangelho», o papa sublinha a responsabilidade das religiões em oferecer «uma preciosa contribuição para a construção da fraternidade e a defesa da justiça na sociedade» (FT,271). No caso do cristianismo a experiência de uma autêntica fraternidade deve acontecer desde muito cedo, no âmbito da família, da comunidade cristã onde se é acolhido, se cresce e celebra a fé e com muito mais razão naquela comunidade religiosa a que se escolheu pertencer.
Precisamos hoje de um renovado compromisso comunitário que favoreça a construção de comunidades cristãs mais evangélicas e por isso mais fraternas. Para que a fraternidade não fique numa proclamação bonita ou num ideal utópico e vazio, o mundo precisa do testemunho profético de comunidades religiosas orantes, acolhedoras, alegres, o que só acontece quando elas vivem unidas em autêntica fraternidade. A fidelidade e a felicidade na vida consagrada estão indissociavelmente ligadas a uma vivência comunitária marcada pelo amor fraterno, a entreajuda, a partilha da fé e dos bens, o diálogo intergeracional.
Na Semana do Consagrado de 2021 pedimos a intercessão de São José, patrono da Igreja, para que proteja todos os consagrados e consagradas. A ele que foi homem fiel e justo, pai amado, pai na ternura, na obediência, no acolhimento, pedimos que guie o caminho dos consagrados na fidelidade a Jesus Cristo e ao seu evangelho, na fidelidade à Igreja e à sua missão, segundo os carismas próprios.
+ António Augusto de Oliveira Azevedo
Presidente da Comissão Episcopal das Vocações e Ministérios