No âmbito da Jornada Mundial da Juventude, a realizar em Portugal, mais concretamente em Lisboa, em agosto de 2023, foi-nos dado o privilégio, a todos os reclusos do Estabelecimento Prisional de Lamego, de contemplarmos ambos os símbolos deste acontecimento: a Cruz Peregrina, como sinal de fé e de esperança, e o Ícone de Nossa Senhor, um retrato da Virgem Maria com o Menino nos braços, como forma de demonstração da presença de Maria junto dos jovens. Junto dos símbolos, efetuámos um momento de reflexão interior.
Independentemente da identidade, claramente católica, esta foi e é uma experiência aberta a todos, visando proporcionar um encontro pessoal com Jesus Cristo.
O Sr. Bispo da Diocese de Lamego, acompanhado por um grupo de jovens e alguns convidados, entre eles um outro seu colega, Bispo Auxiliar de Lisboa, contando com a presença da Ex.ma Senhora Diretora deste Estabelecimento Prisional, assim como vários elementos do Corpo da Guarda Prisional, demonstraram que, por vezes, é possível esbater as diferenças, que podemos ser um todo, que errar é humano e que cabe a cada um de nós fazer um novo caminho; aos olhos de Deus, não é por estarmos em reclusão que somos diferentes.
Das ilações retiradas das palavras dos Senhores Bispos, podemos concluir que este encontro demonstrou também um exemplo para todos os jovens convidados e alheios à realidade prisional, pois a prisão não tem que ser vista como sum sítio onde só existe maldade.
Juntos refletimos e entoámos cânticos de louvor.
Foi, sem dúvida, um dia diferente, sobretudo pela paz interior que se sentiu.
Restas-nos agradecer a todos os elementos que nos proporcionaram este momento e desejar o maior dos sucessos nestas Jornadas Mundiais da Juventude.
Toda a Fé é Esperança e Crer em Deus é alimentar uma amanhã melhor.
Carlos Manuel Rodrigues Soares
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Tudo muda – Símbolos da JMJ no Estabelecimento Prisional de Lamego
Por D. Américo Aguiar, Bispo Auxiliar de Lisboa
Em Lamego, acompanhei a Peregrinação dos Símbolos da JMJLisboa2023 ao estabelecimento Prisional da cidade. Até hoje, fui o momento mais emotivo que já vivi na "aventura" desta Peregrinação.
Quando chegamos, o medo e o receio de entrar foi uma realidade. Não é à toa que altos muros e vários níveis de segurança nos separam "deles". Fomos acolhidos num pátio com muito sol, calor, poucas sombras. A Cruz, o Ícone de Maria com Jesus, jovens, um padre, dois bispos, uma viola, cânticos... E um coro de homens, com sorrisos, mais ou menos empenhados no momento. Perguntei se havia alguém do Porto... sim... E também de Vila Nova de Gaia. E fui-me deixando levar, envolver...
Com Cristo ali, no meio de nós, fui-me questionando: olhava cada irmão recluso e pensava que podia ser meu pai, meu irmão, meu cunhado, avô, amigo, conhecido, vizinho.
Cada rosto era-me quase familiar, no carinho e na relação de hipóteses já elencadas. O que fizeram para estar ali? O que lhes aconteceu? O que lhes fizemos? As perguntas inquietaram-me. Senti como pode ser instintivo o desejo de os ajudar, recuperar, libertar, salvar!
Quero acreditar que a privação da liberdade os vai ajudar a ganhar força para se reabilitarem e voltarem aos seus, a nós. Ecoaram no meu coração as palavras que fixei: “Não quero a morte do pecador”… E se naquele grupo de reclusos também estivesse eu? Todos somos feitos do mesmo barro e é o mesmo Espírito que nos vivifica...
No fim da visita, os reclusos que quiseram tocaram a Cruz e o Ícone de Maria com tanta emoção, tanta solenidade, tanta verdade... Chorei sem lágrimas porque tive vergonha...
Quando olhamos para o outro comos olhos e o coração de Jesus Cristo tudo muda... Tudo.
in Voz de Lamego, ano 92/37, n.º 4668, 3 de agosto de 2022